Adoro-te.
Adoro a tua imagem, o teu olhar enigmático que nunca deixa verdadeiramente transparecer o que te vai na alma.
Adoro cada curva do teu corpo, cada traço que te define.
Perco-me durante horas, dias se for preciso, na tua imagem.
Venero tudo em ti. És a perfeição. És única, insubstituível.
Sinto o teu odor e arrepio-me, o teu toque faz-me estremecer, sair de mim. Elevas-me a um nível que nunca imaginei ser possível.
És a música que quero ouvir até que a minha alma decida abandonar o meu corpo. A tua voz é suave, doce, límpida. Faz-me sentir que estou a voar sobre todo este lodo em que vivo.
O teu corpo é um sonho. Um desejo intangível para o comum dos mortais. Uma tentação até para quem diz ser imune ao desejo.
A tua perfeição leva-me a pensar que não sou merecedor de ser teu, de seres minha.
A luz que deixas transparecer elimina toda e qualquer réstia de escuridão que teimosamente insista em trazer tristeza à minha vida.
És bela, a mais bela.
És tudo para mim, és minha e eu sou teu. Teu até ao fim, mesmo depois do abraço inevitável da morte. Serei teu, serás minha.
Abro os olhos. O tecto é negro, o ar é húmido, desagradável, doentio. As paredes de cimento, por pintar, cercam-me. Parecem querer abraçar-me num aperto sufocante.
Penso novamente em ti e encaro a realidade. Não existes. És um sonho, o meu sonho.
Fecho os olhos e volto à podridão.
Adoro-te, mas não és real.