quarta-feira, dezembro 23, 2009, posted by # 7 at 01:09
E pronto, lá se foi a aventura da Serra da Estrela. Mas não uma boa aventura, devo dizer. Ou melhor, agora, que estou seco e quente, em minha casa, até me sinto tentado em dizer que foi uma aventura cheia de peripécias, que, no fim se revelou gratificante. Mas na altura em que lá estava, a congelar, sozinho no meio de uma tempestade súbita, não achei piada alguma.

Mas comecemos do princípio, tal como tudo na vida.

Arrancámos ontem, eu e dois amigos, para pernoitarmos na casa do norte, de modo a não termos que percorrer tantos Km no dia de subir. Chegámos, não tínhamos luz graças à minha falta de vista ao não me aperceber que um interruptor do quadro geral estava desligado, comemos, vimos um pouco de tv e fomos para a caminha.

Na manhã de hoje, tudo tranquilo. Acordar, arrumar as coisas, tomar o pequeno-almoço em Oliveira de Frades e vamos ao caminho que se faz tarde. 

Durante o trajecto apanhámos de tudo: frio, chuva, Sol, calor, nevoeiro, enfim, o pacote de canais completo.

Chegámos a Seia, encontrámo-nos com os restantes elementos que subiram, equipámo-nos e partimos.

Devo dizer que, sempre que me falaram da subida à Serra, me disseram que eram apenas 30 km de subida mas que eram os 30 km mais duros que se podia imaginar. Essas afirmações, para ser sincero, deixaram-me algo receoso pois, embora treine bastante, não gosto de penar como um animal, como é óbvio. Mas não, não são 30 km assim tão duros. É uma grande subida, é certo, mas nada do outro mundo. Qualquer pessoa com o mínimo treino a consegue fazer, mais rápido ou mais devagar, claro.

Ainda assim, lá fomos. A menos de meio já ninguém sentia os pés. Na primeira paragem, no Sabugueiro, a chuva começou a cair intensamente e o frio fez-se sentir ainda mais.
Voltámos a arrancar. Pouco tempo passou e já haviam elementos que falavam em desistir. O grupo começou a separar-se e, quando dei por mim, estava só, ainda que conseguisse ver dois à minha frente. Acelerei e consegui apanhá-los. Foi aí que a minha bike deu de si. A roda de trás começou a dançar e era extremamente difícil manter a bike de pé. Ainda para mais, levantou-se uma tempesdade mais e mais forte.

Tentei continuar, mas o vento empurrava-me para o meio da estrada, Nevoeiro, vento, chuva, frio, muito muito frio. Comecei a recear ficar a pé e resolvi voltar para trás. Por muito que digam que a subida é difícil, nas condições climatéricas que estavam, a descida é muito pior. Como deixei de me esforçar tanto, comecei de imediato a congelar. Por momentos pensei que ficaria ali, sozinho até que alguém desse comigo. Mas insisti. Continuei a descer. Encontrei um amigo que vinha também sozinho e também ele voltou para trás. Quando dei por mim, todos os que estavam atrás de mim tinham desistido.

Desci e desci até que fui ter à Lagoa Comprida. À porta do café estavam muitas bicicletas no chão e, logo atirei a minha para o monte.
Quando entrei estavam lá os restantes que haviam decidido não subir mais. 
A princípio, apenas sentia a dor nos pés e mãos. Segundos depois, comecei a sentir-me mal, deixei de ver bem e não sabia o que estava a dizer. Tiraram-me a roupa e enrolaram-me em mantas. Bebi um chá bem quente e comecei a ficar melhor.
Passado pouco tempo, um outro colega chegou. Estava pior que eu. As suas pupilas começaram a dilatar e tiveram que o levar para o interior da loja, para o aquecer. 
E a seguir, mais dois.

Resumindo, todos os que me chamam maluco, por ir para a serra de bicicleta, com este tempo, têm razão. Toda a razão.

Tenho que dizer que pensei sinceramente que iria ficar ali, no meio da tempestade, gelado até aos ossos. Sim, senti medo, medo a sério. Medo de não ter forças para voltar, de ali ficar e nunca mais ver quem amo. Senti a solidão mais extrema possível e, por breves instantes, senti vontade de largar tudo e sentar-me ali, no meio do nada, até que o cansaço superasse a minha vontade. Exagerado? Talvez, mas, no momento, foi exactamente assim que me senti.

Nem a roupa consegui tirar. Não tinha controlo dos meus movimentos, ão raciocinava bem.
Não repitirei esta façanha. Frio? Ok, tudo bem. Vento? Algum, pode ser. Chuva? Na boa, só molha. A junção dos três? Nunca mais. Minha rica caminha. 
 
Ah, e existem fotos minhas, bem tristes, mas que, ainda assim, as colocarei aqui, para que não digam que não tenho sentido de humor.
 
Emanuel Simoes

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