terça-feira, maio 22, 2012, posted by # 7 at 15:30





A noite continuava agradável. Como que uma imitação ou cópia daquela em que tudo me foi retirado.
Só que agora, era a minha vez de retirar.

O animal ali estava, estendido a meus pés, indefeso. Toda a sua brutalidade, violência e poder de intimidação nadas significavam agora. Era apenas um monte de carne flácida, à minha mercê.
Hora de obter a minha recompensa.

Creio que desde aquela noite, sempre soube que este momento iria chegar. E precisamente por isso, tudo o que era necessário encontrava-se no interior da minha viatura, aguardando pela hora da sua utilização.

Sempre gostei de conduzir à noite, especialmente em noites tão agradáveis quanto esta.
A viagem até ao bosque foi rápida. Mas, se por um lado estava a saborear a viagem, por outro, anseava a hora de de concretizar a minha vingança.

Retirei a besta de dentro da mala do carro e amarrei-o a uma árvore.
Curiosamente, algumas nuvens começaram a cobrir o céu, fazendo com que os reflexos da lua as tornassem como que saídas de um filme de terror. Extremamente apropriado.

Esperei que ele acordasse, sempre olhando para aquela face horrível, aguardando por fitar aqueles olhos.
Quando acordou, estava confuso e, após alguns momentos de desorientação, notou a minha presença e desde logo começou a ameaçar-me: "Vou-te matar, cabrão. Vou-te enfiar num buraco e nunca mais ninguém vai saber de ti.".
Aquela arrogância não tinha limites. Mesmo numa situação de inferioridade, apelava à violência, à prepotência.

Aproximei-me lentamente, cheguei a minha boca aos seus ouvidos e disse-lhe: "Já me mataste há algum tempo, naquela praia abandonada. Só estou a retribuir o favor.".

A expressão de rufia passou para um olhar de espanto.
"Tu és aquele gajo? Mas não tinhas batido as botas?".

"Aparentemente as minhas botas não chegaram a bater. Mas, seguindo esse raciocínio, creio que as tuas se preparam para um choque brutal.".


"Não tens tomates para isso, tótó. Se pensas que me assustas, caga lá nisso. E nem penses que me endrominas com conversas de bófias. Nunca vou dizer nada nem confessar nada."


Claramente, aquele traste estava equivocado quanto às minhas intenções.
Apesar de me sentir desde logo tentado a responder-lhe, ponderei momentaneamente e resolvi antes agir.


Antes de começar, coloquei-lhe um lenço na boca, pois apesar de estarmos bem afastados de tudo e de todos, nunca se sabe se poderá haver uma alma errante pelos bosques.


O serrote foi o primeiro utensílio. Mais uma vez, a expressão no olhar daquele triste espécimen mudou drasticamente. De furioso para assustado.
Não me detive muito tempo a fazê-lo sentir-se ameaçado. 
Comecei pelo pé esquerdo, serrando vagarosamente, sentindo a lâmina penetrar na carne, enquanto o vilão se contorcia com dores e tentava, em vão, gritar.
Chegando ao osso comecei a ter mais dificuldades, mas a lâmina era boa e, com alguma persistência, consegui o efeito desejado.


Ele já estava com o corpo totalmente rígido, de tanta força que fazia devido às dores. 
Segurei o pé amputado e coloquei-o a alguns metros dele, mas bem visível, para que pudesse realmente perceber o que estava a acontecer.


Mas nem tudo foi mau para este assassino, violador. 
Administrei-lhe morfina em quantidade suficiente para que as dores pudessem ser menores.
Afinal, de que me valeria se ele desmaiasse e perdesse o espetáculo? Que tipo de entertainer seria eu?


Quando senti que já estava melhor, cauterizei-lhe o ferimento. Nova onda de dor. 
Claramente, ele tentava dizer-me algo, talvez pedir que parasse, pedir por misericórdia.
Mas isso não estava nos planos. Parar, só no final. E a viagem ainda agora havia começado.


Dediquei-me então à mão direita. Fazer as coisas em cruz, tal como se aperta a roda de um carro, para que fique bem posicionada.


Quando ambas as mão e pés já não faziam parte do seu corpo, o sangue parecia irradiar uma brilhante luz, iluminando os bosques negros com intensidade.
Resolvi desamarrá-lo. Com a quantidade de droga que tinha dentro do seu corpo, certamente não teria forças para sequer tentar a fuga.


Passei então às lâminas. Aquele brilho maligno nos seus olhos, aquele brilho que durante tantas noites me manteve acordado, não poderia estar escondido. E ele parecia defender-se do que se passava, fechando os olhos.
Cortei-lhe as pálpebras, com gentileza, para não danificar a visão, claro.
Depois passei para o nariz, para as orelhas e, por último, a língua.


A língua foi complicada, pois ele não queria colaborar. Mas, com mais ou menos dificuldades, com mais ou menos corte, acabei por conseguir o pretendido.


Tempo para uma pausa.
Desde aquela noite que ganhei um novo e nefasto vício: o tabaco.
Sentei-me a cerca de 2 metros dele, ou do que restava dele. Acendi um cigarro e fumei-o calmamente.


Nitidamente, apesar de toda a morfina, as dores haviam se apoderado dele. Contorcia-se, tanto quanto podia, claro, emitia estranhos sons, fazendo com que o sangue jorrasse daquele orifício que antes se chamava de boca.


Terminando o cigarro, passei às agulhas. Uma longa agulha consegue causar uma boa dose de dor. Um ataque aos nervos, por assim dizer.


Senti que o fim estava próximo, mas ainda queria fazer algumas experiências, antes que o último sopro de vida abandonasse aquele corpo.


Resolvi então tentar algo que havia visto num qualquer filme de terror, na minha juventude. Arrancar um olho com uma colher.
Não foi tão fácil quanto no filme, mas, por outro lado, eu tinha que retirar o glóbulo ocular sem danificar demasiadamente o nervo. Queria que ele fosse ainda capaz de ter alguma visão.
E consegui. Aquele olho pendurado era quase hilariante, digno de um palhaço de circo.


O que estava à minha frente já não era aquela besta intimidante, aquele gorila violento que conseguia obter tudo o que queria através do sofrimento dos outros.
Desta vez, ele era o sofrimento. Ele era a dor. Aquele torso desmembrado, desfigurado, repleto de sangue e vísceras, não transmitia mais que repugnância.


Era tempo de terminar. 
Segurei-lhe o olho e apontei-o para mim. Não sei se ele conseguia ou não ver-me, se consegui ou não ouvir-me, mas sussurrei baixinho: "Acabou a tua viagem. Vemo-nos no Inferno.".
Com uma lâmina bem afiada, abri-lhe a garganta. Mais sangue começou a jorrar e ele começou a guinchar, fazendo lembrar um porco quando está a ser morto. Bem, ponderando sobre o assunto, ele era um porco.


Durou pouco mais de 1 ou 2 minutos, até que o que restava daquele traste de ser-humano desfalecesse por completo. 


Voltei a sentar-me, a acender outro cigarro.
"Tenho que deixar isto.", pensei.


Terminado o cigarro, foi tempo de tratar da cabeça.
Estava cansado e não me apetecia voltar a serrar. Resolvi utilizar o machado. Mais violento, mas mais rápido.


Cabeça tratada. Segurei-a pelos cabelos e fitei mais uma vez aqueles negros olhos. O brilho havia desaparecido.


Mais uma vez, tal como naquela noite na praia, tudo havia terminado para mim.


Nessa noite, finalmente dormi.
 
Emanuel Simoes

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