O tempo vai passando e eu, bem, eu cá continuo. Eu cá me deixo levar pela correnteza da incerteza do amanhã, sempre sentindo que poderia ter feito mais, que poderia ter menos do que tenho e ainda assim ser feliz, que poderia ser o que não sou, ir onde nunca fui, dizer o que nunca disse.
Gostava de sair de casa, deitar-me no meio da rua, olhar para o céu e não me preocupar sobre o que os outros dizem. Gostava de gritar quando me apetece gritar, chorar quando me apetece chorar, sem que nada nem ninguém me pudesse fazer sentir deslocado.
Mas a verdade é que, mesmo não querendo admitir, vivo num mundo onde o que os outros dizem interessa. Onde se vai vivendo na sombra do que realmente queremos ser, pois é isso que as normas existem.
A verdade é que vivo numa prisão aparentemente sem muros visíveis, mas que, na sua invisibilidade, são mais sólidos do que os de betão armado.
Gostava de sair por aí, a sorrir, a chorar, a cantar, a falar, sem que o julgamento de terceiros se abatesse sobre mim.
Mas não consigo, não posso. Afinal, o que diriam as pessoas? Que tipo de cidadão seria eu se fosse diferente dos outros, se ousasse afastar-me do rebanho?
Gostava de subir a um prédio alto, sentar-me no telhado e simplesmente ali ficar, sem preocupações, sem receios, sem ninguém para me tentar influenciar.
Mas não posso, pois se me atrevo a ser quem quero ser, logo me apelidam de louco, de irresponsável, de egoísta.
Como tal, tenho que ir tentando ser como querem que seja, disfarçando a enorme tristeza que sinto por assim ter que viver. Até ao final, até ao meu último suspiro. Uma vida de faz-de-conta, de ilusão, de fingimento.