
Tenho o corpo molhado mas não sinto frio, os relâmpagos caem perigosamente perto, mas não receio a morte.
Já estou morto. Há muito que a minha mente abandonou este triste e enfadonho mundo, mas a minha alma insiste em ficar presa dentro desta carcaça a que chamo corpo, como que expectante por algo que há-de vir. Algo milagroso que supostamente surgirá do nada e me levará a acreditar novamente na luz. TRETAS.
O que sinto não importa, o que penso a ninguém interessa.
As gotas correm furiosamente pelo meu corpo, formando minúsculas cascatas. Como um enorme aglomerado de lágrimas. Como se nesta noite sombria, estivesse a chorar tudo o que guardei dentro de mim ao longo dos tempos.
Elevo a cabeça e fito o céu cinzento. As nuvens são violentamente empurradas pelo forte vento que se faz sentir e que uiva. Uiva alto e imperativo, fazendo notar a sua presença.
As verdadeiras lágrimas confundem-se com chuva que me cai no rosto e isso deturpa a minha visão.
Estou louco. O frio extremo, a chuva, o vento e a sujidade que me envolve, toldaram-me o discernimento.
Parece uma luz a descer sobre mim. Não. É impossível.
Uma luz que tem tanto de brilhante como de negro, se é que tal é coerente.
O frio parece abrandar e o vento não uiva com tanta intensidade. A pedra sepulcral que se encontra à minha frente adquire cores estranhas e fantasmagóricas.
Será que..... Sim, é verdade, és tu.
Envolves-me nas tuas majestosas asas e libertas as minhas que se encontravam escondidas. Escondidas de vergonha neste antro em que me encontro.
O frio desaparece e sinto o teu calor, meu anjo negro. Dás-me esperança incerta, mas ainda assim, esperança. A força parece voltar a correr nas minhas veias e agora percebo a teima da minha alma.
Afinal, estava escrito que me salvarias.